quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Vida Entre Idas

André de Moraes



















Despedindo-se ia embora o sol
Levando o barco consigo
Sem, todavia, fechar as janelas do abrigo
Onde cultivamos o amarelo girassol
Alimentado por nossas luzes em farol
Que deixavam as claras o beijo amigo
Tanto com todos quanto comigo
Nunca se apagavam senão abaixo de um lençol

Continuava a leve partida
Dos pertencimentos nunca suficientes
Para uma vida que busca liberdade em torrente
E, vivendo o amor, emergia decidida
Como quem um dia ficou dividida
Mas agora sorria como quem nunca fora contente
Ao não se conter em desejo eminente
Deixava ir o barco que lhe trouxera a vida

Até o pássaro voou
Agressivo e arredio a cada grade da gaiola
Fazendo pensar no quanto lhe pareceu esmola
Todos os momentos em que não se embriagou
Todos os corações que não frequentou
E a infertilidade de tudo que havia naquela sacola
Mas agora feliz sorria ao pensar na nova escola
Onde a alegria a despiu e beijou

Nada ia sem leve alívio e lamento
Mas ficavam os raios de sol mais ardentes
Que, no fundo, despertavam a adormecida mente
E explicitavam nossa virtude de ser vento
E dançar com quem encontra ao relento
Deixando mais sorrisos mesmo no mais contente
Enquanto o amor se torna carinhoso e indecente
E se propaga no leve e intenso movimento

Nuvens testemunharam tudo
Da mais alegre e vibrante euforia
Que vem e volta como sexo em melodia
E ao mais falante deixa mudo
Como quem reconhece o prazer e abaixa o escudo
Entendendo a despedida como uma galeria
Onde a perniciosa arte por toda parte estaria
E sugerisse lembranças como quem toca veludo

Mas ainda permaneciam idas
E entre o que se foi e o que vem depois
Nada mais habitava senão nós dois
E nossa liberdade de sermos almas perdidas
À encontrar a intelectual libido naquelas descidas
Que levavam à profundidade que sempre se expôs
E ali habitamos nas delicias que um dia se propôs
Serem infinitas como parecia ser sua nova vida...


Foto: Thiago Franco, 2015.

sábado, 21 de fevereiro de 2015

Dias de Café

(André de Moraes)

Tão banal quando comer
Seriam aqueles dias
Quando tu chegavas e eu partia
Mesmo quando não era a ideia se esconder
E sozinho ao anoitecer
Sobre o ócio refletia...

Sabe aqueles dias
Quando o passado parecer fazer mais sentido
O passar no presente é um alívio
E o futuro nos é mera fantasia

Aqueles que simplesmente passam
Sem relógio que o meça
Ou atraso que lhe seja pressa
E apenas de um lado para o outro vagam

Dias que encharcam os olhos
Remontam-nos ao beijo
Ao sorriso que ornamentou o ensejo
E perfeito entardecer naquele colo

Esses mesmo de preguiça e lençol
Quando o trabalho pesa mais
A cabeça leva e trás
Os ardores de um dia de sol

Por esses dias havia vida e mundo
Mesmo que escondidos no bolso
Que àquela altura era como poço
E nossas mãos chegariam ao fundo

Dias quase perdidos
Se não fosse o corpo
Que descansa em cada porto
E em curto tempo o torna comprido

Sim.
Dias de dizer adeus
Às ruínas que sobraram daquele tempo
Que mesmo servindo para novo monumento
Não deveria compor o meu

Dias passageiros e permanentes
Que descontam momentos de plenitude
De um passado envolto em atitude
Que faz ressurgir o desejo latente

São apenas dias de fé
Daqueles que temos que passar a pé
Mas nada que um bom passado não envolva
Um intenso presente não resolva
E um imprevisível futuro não devolva
E o dia seja apenas como um bom café...

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sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Amadorismos de um Governo Estadual Alheio às Políticas de CT&I

(André de Moraes)

Analisar comparativamente a conjuntura política nas diversas escalas no âmbito nacional é uma demanda contínua. Para além da verticalidade partidária ou de coligações, o que garante certo nível de alinhamento político entre as escala nacional e estadual/municipal, existe uma demanda de que os estados e municípios estejam atentos às discussões em âmbito nacional para não perder oportunidades, falando no sentido estratégico mais técnico do que político.

Infelizmente, o Estado do Amazonas (onde resido) nunca foi um modelo nessa estratégia e a situação tende a se agravar com o "novo" governo estadual que temos. Prova disso é a hipótese de extinção da Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Inovação do Amazonas num momento histórico no Brasil com a promulgação da Emenda Constituinte (EC) 85 que inclui, definitivamente, a CT&I como Política de Estado referendada na Constituição. Tal ação reconhece o avanço nas discussões de soberania que, há muito, incorporaram a CT&I como parâmetro incontestável, uma vez que nenhuma nação pode se considerar soberana se depende de tecnologias desenvolvidas em outras. Daí a questão do CsF priorizar as áreas tecnológicas, etc. (um modelo de desenvolvimento questionável, mas de importante compreensão). Torna-se irônico pensar que, por muito tempo, essa pauta foi liderada pelo então Secretário da SECTI-AM, Odenildo Sena, quando este era presidente da CONSECTI e, talvez no momento de sua efetivação nem tenhamos SECTI para comemorar, tampouco, usufruir dos benefícios desse avanço.

Nesse contexto, somente um pragmatismo político muito amador para questionar a importância de uma instituição para coordenar as as políticas de CT&I em âmbito estadual. O ridículo argumento de extinguir a SECTI como forma de enxugar a máquina pública é completamente inconsistente. Mesmo eu que não sou um especialista em administração pública sei que o orçamento da SECTI-AM, que é bem aquém do que deveria, é despendido quase que totalmente para folha de pagamento, além de algumas outras rubricas que viabilizam suas atividades fim e meio. Assim, como sustentar que esta onera a máquina pública?

Demonstrar vontade política de ajustar as contas do estado seria tratar a LDO com seriedade e, acima de tudo, lutar contra a corrupção. Mas como já venho discutido com alguns amigos, parece-me que, mesmo se não houvesse corrupção, muita coisa não andaria por conta da falta de capacidade técnica e gerencial da maior parte no alto escalão, principalmente de assessores diretos do governador. No caso do governo José Melo no Amazonas, parece que padeceremos dos dois problemas e pior, regredindo nas políticas de ciência, tecnologia e passando longe da inovação que ainda não esta tão próxima assim, mas certamente tem/tinha um caminho promissor.

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terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Velhos Amores... Aquecer ou esquecer?

(André de Moraes)




Velhos amores... Esquecer ou aquecer?


Para esquecer, tempo. Para aquecer, momento.
Para esquecer, amigos. Para aquecer, abrigos.
Para esquecer, espaço. Para aquecer, abraço.
Para esquecer, novo. Para aquecer, povo.
Para esquecer, farol. Para aquecer, lençol.
Para esquecer, viagem. Para aquecer, imagem.
Para esquecer, perdido. Para aquecer, despido.
Para esquecer, drama. Para aquecer, cama.
Para esquecer, luta. Para aquecer, puta.
Para esquecer, míngua. Para aquecer, língua.
Para esquecer, morto. Para aquecer, corpo.
Para esquecer, balança. Para aquecer, dança.
Para esquecer, distante. Para aquecer, ofegante.
Para esquecer, inteiro. Para aquecer, cheiro.
Para esquecer, nexo. Para aquecer, sexo.
Para esquecer, ira. Para aquecer, “vira!”.
Para esquecer, escolta. Para aquecer, volta.
Para esquecer, reações. Para aquecer, posições.
Para esquecer, oculta. Para aquecer, sutra.
Para esquecer, súplica. Para aquecer, música.
Para esquecer, doses. Para aquecer, goles.
Para esquecer, romaria. Para aquecer, putaria.
Para esquecer, agonia. Para aquecer, poesia.
Para esquecer, cachaça. Para aquecer, mordaça.
Para esquecer, não. Para aquecer, mão.
Para esquecer, maldição. Para aquecer, ereção.
Para esquecer, dúvida. Para aquecer, úmida.
Para esquecer, dor. Para aquecer, amor.
Para esquecer, amor. Para aquecer, dor.


Velhos amores... Esquecer ou aquecer?




Ilustrações: Kerolayne Klembim.