quinta-feira, 17 de março de 2011

A Revolução dos Inválidos

Eis uma poesia que é riquíssima para refletir a conjuntura política atual no mundo. Deleitem-se com a percepção aguçada do Otto.


A revolução dos inválidos
29 de Setembro de 2009

Por Otto João Leite

Não existe fortuna ou ações na bolsa
Que me valham o prazer de escutar
Os doces acordes do bandolim
E o contrabaixo do violão
Este colosso que sustenta tudo
Numa seresta que ressoa
Ao toque do pandeiro como relógio
O relógio sincopado dos boêmios

E as vibrações doces do cantar
Do velho encanador
Cantando os sonhos da boemia
O pandeiro do velho da janela
O canto dos teus velhos seresteiros

O doce som do samba canção
O choro do cavaco inclemente
Sentado em uma mesa que eu mesmo fiz
Bebendo a cachaça doce de Minas
No bar em meio a meus camaradas
O quartel general dos boêmios
Amigos de coração
Camaradas de greves e combate
Hoje a greve é greve da arte

Dali sairá a nossa revolução
Tremam de medo, poderosos!
Faremos desta cidade o Soviete de Munique
O quartel virará um teatro
O cartório um botequim
Os carros cederão lugar
Às bicicletas e aos trilhos
E as ruas do centro se tornarão um grande boulevard

Renascerão as pedras do calçamento
Do meio do asfalto rachado
A Igreja virará um belo museu
E as novas Igrejas….
Fugirão seus pastores,
E seus salões virarão verdadeiras Assembléias!

Nossa Comuna governará
Todas as manhãs seu comitê central
Recitará poesias em um palanque
E a música, será o princípio de nossa constituição

Ao invés de especialistas
Nomearemos amadores
As faculdades ensinarão coisas inúteis
Os muros serão derrubados, as cercas arrancadas
As paredes virarão murais
Títulos serão apenas nome de livros
Os homens comuns farão o incomum
Numa terra posta em comum!

Os seresteiros anônimos
Serão coroados heróis
As ruas terão nome de sambas
E vossos vereadores, estas velhas dores
Cairão no esquecimento
A estátua do velho coronel
Será um cagatório de pombos!

Pobre prefeitura
Eles não querem mais tocar para vocês
Seus burrocratas ficarão desempregados
O canal de TV irá à falência
As pessoas vão passar a noite nas ruas conversando

Os moto-boys vão aposentar suas motos
Virarão todos artistas
Farão arte nos restaurantes cheios de gente
O carnaval haverá de tomar as ruas
E o sambódromo ficará vazio

Os office-boys virarão sambistas
Os burocratas sindicais vão catar papel
Ou farão promoção pessoal
Ao cargo de palhaços
Do circo que abriremos
Onde um dia foi o palácio do governo
Com realejos tocando
E peças do Plínio Marcos encenando

As escolas não serão mais presídios
Suas grades serão arrancadas
A grade curricular será abolida

A nossa comuna há de reinar
Haverá esquetes de teatro
Sob cada uma de suas câmeras
E a câmara, aquele velho túmulo
Para ela será transferido o cemitério
E seus ilustres mandatários
Contemplados com cargos de coveiros

Tuas fábricas serão automatizadas
Teus gestores não gerirão mais nada
Limparemos o rio para nele pescar!
Teremos bailes e serestas todos os dias
Precisaremos inventar ocupações
Tempo que não será mais gasto
Mas ganho, de graça
Tempo para viver e amar


Os orgasmos simples serão abolidos
Pois serão desnecessários
Estraga-prazeres
A vida será o gozo contínuo

Teus Partidos serão partidos em mil partes
Não queremos mais a parte, queremos o todo
A vida será gratuita
Tuas catracas serão peça de museu
Teus vales irão para o picador de papel
Teus números serão deletados
De tua riqueza, ficará a miséria
E a miséria que a alimentava, virará fartura!
Nossa moeda serão as canções
Entre numa loja e pague com um poema

Os relógios terão trinta horas
As noites serão mais longas
Para boemia, poder amar e sonhar
As semanas terão cinco dias inúteis
E apenas dois dias úteis

Teu capital será um capítulo passado
Teus capitães serão bustos enferrujados
Teu Estado, sofrerá uma mudança de estado
Do sólido para o gasoso
Mercadoria sem valor
Dinheiro que não vale nada
A festa dos desvalidos
O teatro dos Inválidos

Nossa comuna haverá de reinar
A poesia que há de se efetivar
A arte que há de se extinguir
Pois a vida irá se estetizar
A filosofia irá se realizar
A revolução que haverá de sair
Das paredes deste humilde bar
Das paredes deste sublime bar

...

quinta-feira, 3 de março de 2011

Barragem no Tietê: Esperança para os Paulistanos

No dia 27 de janeiro de 2011 a mídia nacional divulgou a seguinte notícia: “Pesquisa indica que 51% dos paulistanos querem se mudar de São Paulo e o fariam se pudessem” (O Estado de São Paulo). Demonstração óbvia de uma trágica tendência: os paulistanos não crêem mais no futuro de sua cidade. Chegando a São Paulo de avião nos defrontamos com uma enorme chaga na mãe-terra. Quem assiste noticiários de TV ou Rádio, ou navega pela internet, testemunha que qualquer chuva forte faz São Paulo atolar na merda, transformando muitos irmãos paulistanos na constrangedora situação de escaravelhos. E a cada ano que passa o fenômeno vem se repetindo com mais freqüência. Entretanto, para os Governos e para boa parte da sociedade urbana iludida e alienada, aquilo é a “locomotiva” do Brasil. Mas, a maioria dos paulistanos, principalmente os pobres, encara, a triste realidade, profetizando o fim próximo da “locomotiva”. Não vê ali futuro para si e seus filhos.
Infelizmente, o Governo não vai de encontro a esta realidade angustiante de quem procura um futuro de esperança. Prefere levar outros povos e comunidades que vivem felizes, com um futuro lindo diante de si, ao mesmo desespero dos paulistanos. Veja o que fez com os Waimiri-Atroari (Kiña), na BR-174, Manaus – Boa Vista por causa do minério e da Hidrelétrica de Balbina; com o povo Parakanã/PA por causa da Hidrelétrica de Tucuruí; com a “Ilha da Viúva” dos índios Tuxá de Rodelas na Bahia que era um verdadeiro sonho de esperança para toda a humanidade (provavelmente foi ali que Antonio Conselheiro se inspirou para criar Canudos), onde a Hidrelétrica de Petrolina acabou com este refúgio de felicidade. A mesma ditadura, com seus grandes projetos “irreversíveis”, ameaça hoje o futuro feliz dos Kaiapó, com Belo Monte; de comunidades rurais e indígenas de Rondônia e da Bolívia, com Girau e Santo Antônio/RO; dos Enawene Nauê e Pareci, com as PCHs do Alto Juruena/MT; e com o futuro de milhares de agricultores dos vales dos rios Uruguai e Chapecó, maiores produtores de alimentos do país com uma série de hidrelétricas. Rouba-se o futuro independente e feliz para substituí-lo pela dependência do Estado através de bolsas de alimentos, produzidos à base de perigosos agrotóxicos e transgênicos.
Por tudo isso e para ir de encontro a angústia da maioria consciente dos paulistanos, propomos a seguinte questão: por que não promovemos a construção de uma grande barragem no Rio Tietê, logo na saída da cidade de São Paulo, barragem que inunde de preferência toda a “locomotiva”, aniquiladora do futuro de seus filhos? Assim, de imediato, o Governo, sempre pronto em alimentar a “leseira” urbana com ilusões de cimento e asfalto, terá recursos para fazer a Reforma Agrária nos latifúndios que se estendem de São Paulo à Amazônia, também eles destruidores da esperança, enquanto aniquilam a biodiversidade, envenenam a terra com agrotóxicos e transgênicos. Vamos implantar ali uma Reforma Agrária, como foi o nosso sonho petista até 2003.
Assim, se abrirá um horizonte cheio de esperança aos paulistanos
atingidos pela barragem do Tietê. Seu futuro se iluminará com a luz da independência e da abundância. E a “locomotiva” definitivamente atolada na lama, também voltará a produzir frutos de esperança, encorajando as mentes para a tomada de decisões em favor da vida no planeta, ansioso por novos paradigmas de organização. As águas do Tietê, hoje devoradoras de gente, descerão a Serra do Mar, amigas, aterrando o asfalto e o cimento com a lama da fertilidade. Sementes brotarão recobrindo edifícios e arranha-céus de cipós. Plantas variadas e árvores cheias de frutos, devolverão a biodiversidade e a abundância ao vale do Tietê para alimentar a festa do povo. Assim, os paulistanos, hoje sufocados por água, lama e fezes, e iludidos pelos homens de Estado, verão os seus filhos, netos e gerações intermináveis, voltarem para sua casa com paneiros cheios de felicidade.
Paulistanas e paulistanos, brasileiras e brasileiros vamos às ruas,
estradas e rios, exigir que o orçamento da “locomotiva”, os 30 bilhões de Belo Monte e os 110 bilhões destinados ao agronegócio sejam transferidos para a Reforma Agrária e atendendo prioritariamente os paulistanos atingidos pela barragem do Tietê.

Casa da Cultura do Urubuí / Presidente Figueirdo / AM – 28 de fevereiro de 2011
Egydio Schwade
http://www.urubui.blogspot.com/