quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

À Vontade, o Samba

(André de Moraes)



O samba me dizia que chorasse
E ali derramei um pouco de ti
Daquele veludo-você que ainda havia em mim
Ou me invadia mesmo se eu me fechasse
Falando à boca ainda que com um beijo a calasse
E naquela noite voltasse a morar em si

O samba me constrangia a sorrir
E perdido na paisagem dos improvisos
Onde perguntas se liam ao invés de avisos
E induzia amores dos corpos sair
E testando os lábios daquela que haveria de vir
Perdia-me no intervalo entre o céu e o piso

O samba de fazia cantar
Um extenso repertório de músicas e mulheres
Sem deixar de lado a saudade daquela que fere
E deixou-se em lembrança em cada olhar
Tanto das que meus olhos e vontades ainda hão de visitar
Quanto àquelas que me foram breves

O samba me fazia fechar os olhos
E no escuro via corações atarefados
Uns correndo para dançar enquanto desamarrados
Outros contentes e aconchegados em seus colos
Mas todos desprendidos e dispostos a um voo solo
Enquanto durasse o tempo de seus pecados

O samba tentou despedir-se de nós
Mas no calor das fantasias que íamos tirando
Percebi que alguns acordes e batuques foram novamente se juntando
E ressurgia aquela livre e coletiva voz
Que trazia-nos de volta da mais distante foz
E ecoou no morro que continuava sambando
Ao regresso do samba à roda brincando
Deixava a saudade lá fora a espera de nós...


Fotos: Sambaqui - República Livre do Samba; André de Moraes (jan/2015).

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