Ontem, dia 26 de agosto de 2014, ocorreu o primeiro debate
entre os presidenciáveis na TV Bandeirantes. Então resolvi escrever esse texto que não busca analisar os desempenhos ali
encenados, mas o debate (o programa
televisivo) em sim enquanto “continente” uma vez que, para o “conteúdo”, não
faltarão analistas. Por um motivo não aleatório, esse é um programa que chama
atenção generalizada. Afinal ali estão aqueles que podem definir os rumos do
país não destituídos de todas as suas articulações e da conjuntura em geral,
óbvio. Mas, numa inquietação particular e compartilhável, problematizei a
função de um debate televisível de
presidenciáveis como veículo de “consensual” importância eleitoral e cheguei a
algumas questões.
O debate como
insumo para o marketing político
O debate ocorre na
televisão onde tudo que se passa é composto de aparência e tem potencialidades
publicitárias em essência. Por que seria diferente com o debate? Imagino os comitês de campanha virando a noite de ontem
para hoje para editar as falas com recuperação de imagens e vídeos antigos para
comparações e veiculação no horário eleitoral de hoje. Mas também buscando elaborar
memes para tentar “viralizá-los” nas
chamadas “redes sociais”, entre outras iniciativas. Ou seja, por um lado as
emissoras buscam audiência com o debate por trás de um discurso de
responsabilidade social e utilidade pública, por outro geram insumos publicitários
aos comitês que, com alguma sorte/azar (dependendo do referencial), podem conseguir
um impacto eleitoral considerável. Didaticamente, a discussão deixa de ser política
e passa a ser meramente eleitoral e mais, deixa de ser eleitoral e passa a ser
publicitária.
O debate e sua essência
superficial
Alguém tem dúvida de que aqueles discursos são milimetricamente
construídos pelas assessorias estratégicas de marketing político, etc.? No fim,
o debate soa como uma grande
distração que não chega à faculdade da coisa. O que mais importa parece ser a
disputa por um desempenho retórico de quem mais se aproxima de um dado perfil
de presidente, sobremaneira difícil de explicar. Como inserir num debate
televisivo todas as tramas sociopolíticas e seu conteúdo ideológico que, no
fim, é o que norteará um governo? Simples, não se insere. É algo de formação
básica cuja ausência remete aos problemas mais elementares de educação, etc. Cada
vez mais distantes de um debate político qualitativo, as aparência ganham
relevo e renegam ao segundo plano o mais importante que é o posicionamento
teórico-ideológico do qual derivam ideias, projetos, propostas e todos esses “pragmatismos”
falaciosamente elevados ao primeiro plano político-eleitoral com jargões do
tipo “vote em propostas”.
O debate e sua incrível
função redentora à despolitização
Penso que seja consenso que a grande massa da população é alheia
à discussão política em níveis alarmantes. É difícil afirmar os motivos disso,
mesmo por que não parece uma relação linear de causa e efeito. Isso posto, também
é razoável afirmar que as eleições são os momentos em que a população é minimamente
instigada a dar atenção a questão política e muitos atendem esse chamado. Daí
entra o incrível papel do debate com
redentor à despolitização. Não raro, existem pessoas sujeitando seu voto ao
resultado (resultado?) do debate. Não
satisfeitos, julgam candidatos e candidatas com posicionamento ideológico, uma
vasta história política e complexas articulações a partir de um desempenho
totalmente ensaiado e superficial naquele momento. Não tenho muitas dúvidas em
afirmar que quem condiciona seu posicionamento à um debate de algumas horas, provavelmente se omitiu da discussão política
por muitos anos. Como face da mesma moda, acredito que quem busca acompanhar a
conjuntura política constantemente dificilmente mudaria sua opinião a partir de
um programa de algumas horas, sejam esses partidários ou não. Assim, o debate é algo construído reconhecendo
esse cenário e totalmente apto a reproduzi-lo.
Não arrisco conclusões sobre esse tema visto sua
complexidade. Apenas decidi compartilhar algumas questões para discussão. Em
todo caso, uma análise de desempenho de um candidato-ator ou candidata-atriz não
quer dizer nada fora do contexto. Por isso penso ser realmente útil discutir o debate em si e não somente seus
resultados totalmente subjetivos e, consequentemente, de difícil mensuração. Além
disso, o efeito que esses programas surtem naquilo que se convencionou chamar
de "opinião pública" é inegável, o que os deixa passiveis de mais
atenção para quem deseja compreender esse processo. Não é o caso de não mais
assistirmos os debates, mas de apenas não sermos tão inocente ao ponto de
pensar que eles esgotam a discussão ou são o clímax das eleições quando, em
verdade, são apenas sínteses incompletas do cenário político-eleitoral-publicitário.
Fonte da figura: http://jornalmetro.com.br/wp-content/uploads/2014/08/estudio-band-debate-andre-porto-metro.jpg
Caro André,
ResponderExcluirGostei muito do seu texto. Você traz à tona importantes aspectos neste contexto das farsas eleitorais. Afinal, será que as pessoas elegem mesmo ou são apenas direcionadas a votar? Acredito que as decisões de quem ganham já são estabelecidas muito antes das campanhas eleitorais. Estas vêm apenas para legitimar algo já posto.