quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Para que Serve um Debate Televisivo Entre Presidenciáveis?

André de Moraes













Ontem, dia 26 de agosto de 2014, ocorreu o primeiro debate entre os presidenciáveis na TV Bandeirantes. Então resolvi escrever esse texto que não busca analisar os desempenhos ali encenados, mas o debate (o programa televisivo) em sim enquanto “continente” uma vez que, para o “conteúdo”, não faltarão analistas. Por um motivo não aleatório, esse é um programa que chama atenção generalizada. Afinal ali estão aqueles que podem definir os rumos do país não destituídos de todas as suas articulações e da conjuntura em geral, óbvio. Mas, numa inquietação particular e compartilhável, problematizei a função de um debate televisível de presidenciáveis como veículo de “consensual” importância eleitoral e cheguei a algumas questões.

O debate como insumo para o marketing político

O debate ocorre na televisão onde tudo que se passa é composto de aparência e tem potencialidades publicitárias em essência. Por que seria diferente com o debate? Imagino os comitês de campanha virando a noite de ontem para hoje para editar as falas com recuperação de imagens e vídeos antigos para comparações e veiculação no horário eleitoral de hoje. Mas também buscando elaborar memes para tentar “viralizá-los” nas chamadas “redes sociais”, entre outras iniciativas. Ou seja, por um lado as emissoras buscam audiência com o debate por trás de um discurso de responsabilidade social e utilidade pública, por outro geram insumos publicitários aos comitês que, com alguma sorte/azar (dependendo do referencial), podem conseguir um impacto eleitoral considerável. Didaticamente, a discussão deixa de ser política e passa a ser meramente eleitoral e mais, deixa de ser eleitoral e passa a ser publicitária.

O debate e sua essência superficial

Alguém tem dúvida de que aqueles discursos são milimetricamente construídos pelas assessorias estratégicas de marketing político, etc.? No fim, o debate soa como uma grande distração que não chega à faculdade da coisa. O que mais importa parece ser a disputa por um desempenho retórico de quem mais se aproxima de um dado perfil de presidente, sobremaneira difícil de explicar. Como inserir num debate televisivo todas as tramas sociopolíticas e seu conteúdo ideológico que, no fim, é o que norteará um governo? Simples, não se insere. É algo de formação básica cuja ausência remete aos problemas mais elementares de educação, etc. Cada vez mais distantes de um debate político qualitativo, as aparência ganham relevo e renegam ao segundo plano o mais importante que é o posicionamento teórico-ideológico do qual derivam ideias, projetos, propostas e todos esses “pragmatismos” falaciosamente elevados ao primeiro plano político-eleitoral com jargões do tipo “vote em propostas”.

O debate e sua incrível função redentora à despolitização

Penso que seja consenso que a grande massa da população é alheia à discussão política em níveis alarmantes. É difícil afirmar os motivos disso, mesmo por que não parece uma relação linear de causa e efeito. Isso posto, também é razoável afirmar que as eleições são os momentos em que a população é minimamente instigada a dar atenção a questão política e muitos atendem esse chamado. Daí entra o incrível papel do debate com redentor à despolitização. Não raro, existem pessoas sujeitando seu voto ao resultado (resultado?) do debate. Não satisfeitos, julgam candidatos e candidatas com posicionamento ideológico, uma vasta história política e complexas articulações a partir de um desempenho totalmente ensaiado e superficial naquele momento. Não tenho muitas dúvidas em afirmar que quem condiciona seu posicionamento à um debate de algumas horas, provavelmente se omitiu da discussão política por muitos anos. Como face da mesma moda, acredito que quem busca acompanhar a conjuntura política constantemente dificilmente mudaria sua opinião a partir de um programa de algumas horas, sejam esses partidários ou não. Assim, o debate é algo construído reconhecendo esse cenário e totalmente apto a reproduzi-lo.


Não arrisco conclusões sobre esse tema visto sua complexidade. Apenas decidi compartilhar algumas questões para discussão. Em todo caso, uma análise de desempenho de um candidato-ator ou candidata-atriz não quer dizer nada fora do contexto. Por isso penso ser realmente útil discutir o debate em si e não somente seus resultados totalmente subjetivos e, consequentemente, de difícil mensuração. Além disso, o efeito que esses programas surtem naquilo que se convencionou chamar de "opinião pública" é inegável, o que os deixa passiveis de mais atenção para quem deseja compreender esse processo. Não é o caso de não mais assistirmos os debates, mas de apenas não sermos tão inocente ao ponto de pensar que eles esgotam a discussão ou são o clímax das eleições quando, em verdade, são apenas sínteses incompletas do cenário político-eleitoral-publicitário.


Fonte da figura: http://jornalmetro.com.br/wp-content/uploads/2014/08/estudio-band-debate-andre-porto-metro.jpg

Um comentário:

  1. Caro André,
    Gostei muito do seu texto. Você traz à tona importantes aspectos neste contexto das farsas eleitorais. Afinal, será que as pessoas elegem mesmo ou são apenas direcionadas a votar? Acredito que as decisões de quem ganham já são estabelecidas muito antes das campanhas eleitorais. Estas vêm apenas para legitimar algo já posto.

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