Abaixo, minha carta de intenção exigida na inscrição para o Programa de pós-Graduação em Biologia de Água Doce e Pesca interior - BADPI do Insituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - INPA.
Carta de Intensão - BADPI 2010
O Interior Pescado nas Doces Águas da Biologia
Temas amazônicos, como as águas e seus recursos, sempre permitem diferentes abordagens, tal qual diversa é sua apreensão pelos que ali condicionam suas vidas. Conhecimentos sólidos sobre biodiversidade, pesca, condições da água, entre outros, e as relações complexas que existem entre estes diferentes componentes, são prerrogativas que justificam a existência de um programa voltado ao estudo dos ecossistemas aquáticos amazônicos como o Programa de Pós-Graduação em Biologia de Água Doce e Pesca Interior – BADPI. Prazeres, desafios e responsabilidades se projetam aos que ousam ser o elo entre tal realidade e a ciência. Nesse contexto, a emergência, em duplo sentido, de pessoas que entendam a importância em tratar o assunto de forma: dedicada, privilegiando a legitimidade e reconhecimento do curso onde pretende ingressar; inovadora, na proposição de novas formas de produção do conhecimento inclusive em áreas pouco exploradas; e interdisciplinar, buscando a interface deste com outros conhecimentos e ferramentas que possam somar com o estado da arte do tema; é uma forma de contribuição com o desvendar das pretas, brancas ou claras águas amazônicas.
Os primeiros e ainda preliminares contatos, sob a ótica da ciência, com a realidade da pesca no rio Solimões, em excursão de campo em outubro de 2006, me instigaram ao estudo dessa realidade, o que resultou em um projeto de iniciação científica sobre o tema. A formação em geografia permitiu uma leitura outra sobre a problemática da pesca e esta base acadêmica, associada a informações coletadas in situ em meses de trabalho de campo, puderam subsidiar análises diferenciadas sobre o objeto de estudo que, à época, foi a pescaria dos grandes bagres migradores. Por volta deste período (agosto de 2007), deu-se início ao estágio no Laboratório de Fisiologia Comportamental e Evolução – LFCE do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA, onde pude ter acesso às pesquisas desenvolvidas na Coordenação de Pesquisas em Biologia Aquática – CPBA e o universo da temática, até então limitado em minha mente. Entre excursões de campo e a convivência no INPA, nasce então o interesse em seguir pelos meandros dos estudos da biologia aquática. Sobressai a biodiversidade ictiologica e as suas relações com o espaço geográfico da Amazônia. O contato com o estudo de peixes elétricos (Ordem Gymnotiformes), e também como consequencia da função atual que estou exercendo no LFCE, de tratamento e organização da volumosa base de dados do laboratório sobre o tema, tem permitido o ensaio de idéias sobre a distribuição geográfica das espécies e sua relação com aspectos fisiográficos da região. Diversas possibilidades se apresentam e, ao analisar os programas de pós-graduação de Manaus, percebi que o BADPI oferece uma estrutura acadêmica sólida para contribuir na minha formação intelectual e no desenvolvimento dessa linha de pesquisa, que representa uma necessidade para estudo faunístico da região.
A inovação na ciência e tecnologia é parâmetro imprescindível para o eficaz enfrentamento dos novos desafios que se põem continuamente na Amazônia. Tal qual é a surpresa nos resultados, inovadora também deve ser o olhar sobre estes, sendo que, por vezes, somente novos olhares podem levar a novos resultados. A referida pesquisa de iniciação científica, agraciada com menção honrosa no Congresso de Iniciação Científica da UFAM – CONIC-UFAM, teve como destaque a inédita abordagem de aspectos relacionados à biogeografia dos peixes no estudo das cidades do rio Solimões. Além disso, a composição de uma música (Baré: bagres e redes) a partir dos resultados da pesquisa os tornaram de mais fácil difusão sendo esta executada tanto na apresentação no CONIC-UFAM, quanto em congressos nacionais onde o trabalho fora apresentado, contando com a aprovação de todos tendo, inclusive, repercussão na mídia local de Manaus. Atitudes criativas no âmbito das abordagens metodológicas e da difusão do conhecimento redundam em maior alcance da pesquisa no tocante aos resultados e na difusão deste. Além disso, experiências da inclusão do conhecimento tradicional nas análises podem ser avaliadas de forma positiva quando descoberto aporte do etnoconhecimento para o objeto de estudo. A abordagem biogeográfica de Gymnotiformes na bacia do Rio Negro tem boas perspectivas, pois tal inventário da biodiversidade não tem sido incluído na agenda de pesquisas em ictiologia na Amazônia como um todo. Com patente importância para estratégias de manejo e conservação, tal abordagem destaca-se como interface entre conhecimentos geográficos e biológicos. O uso de ferramentas de geotecnologia para tratamento e análise de imagens de satélite, espacialização dos dados e operações de estatística espacial são promissores nas análises ao que se pesem os fecundos resultados que tem sido encontrado na abordagem interdisciplinar perfeitamente possível com o uso dessas técnicas.
A proposta de uma dissertação que realmente resulte em contribuições significativas deve considerar esses e outros fatores. Optar pelo caminho acadêmico-científico de interpretação da realidade é uma construção que necessita de bases sólidas e compromisso para se efetivar num mundo onde o continuísmo insiste em residir. Entretanto, dedicação, inovação e interdisciplinaridade não são suficientes em si. Tais aspectos devem estar integrados e contar com doses bastante concentradas de uma afinidade com a Amazônia e seus problemas. Nobres intenções de contribuição na descoberta do novo para o avanço do conhecimento científico sobre a realidade sempre habitam os discursos dos muitos, e as práticas dos poucos. Para os que voltam para os seus, talvez fique a história de uma região que precisa ser conservada e mesmo o sentido de missão cumprida. Os que permanecem, quiçá percebam que somente a defesa de suas dissertações e teses não é suficiente contra o ataque da inconseqüência que protagoniza a degradação ambiental. Por vezes se cruzam tais fatos e, entre despedidas, seja de suas origens para os que ficam, ou de suas áreas de estudo para os que se vão, as ações não se tornam reflexivas no pensamento nem na realidade. Novas ponderações são necessárias quando se considera esse cenário. De qualquer forma, quando as práticas antecipam o discurso é sinal de que as chances de se alcançar uma práxis estão próximas mesmo que estas tenham sido cotidianas, na vida de quem nasceu e vive na região, e somente depois, com o ingresso na academia, passaram a ser científicas, como é meu caso.
____________________________________
André de Oliveira Moraes
Candidato
Leia e reflita!